*(LITERATURA CLANDESTINA REVOLUCIONÁRIA)*MICHEL FOUCAULT LIBERTE-ME.

VC LEU MICHEL FOUCAULT,NÃO?ENTÃO O QUE VC ESTÁ ESPERANDO FILHO DA PUTA?ELE É A CHAVE DA EVOLUÇÃO DOS HUMANOS.HISTORIA DA LOUCURA,NASCIMENTO DA CLINICA,AS PALAVRAS E AS COISAS,ARQUEOLOGIA DO SABER,A ORDEM DO DISCURSO,EU PIERRE RIVIÉRE,A VERDADE E AS FORMAS JURÍDICAS,VIGIAR E PUNIR,HISTORIA DA SEXUALIDADE,EM DEFESA DA SOCIEDADE,OS ANORMAIS...EVOLUÇÃO OU MORTE!

Thursday, March 20, 2008

entrevista Michelle Perrot 20/03/08

O que podemos dizer àqueles que se indignam com o fato de termos dedicado uma reportagem especial na revista, um livro e um campo de pesquisa às mulheres, surpresos por não fazermos o mesmo com relação aos homens?Michelle Perrot: Os homens estão aí. A história dos homens está aí, onipresente. Ela ocupa todo o espaço e há muito tempo. As mulheres sempre foram concebidas, representadas, como uma parte do todo, como particulares e negadas, na maior parte do tempo. Podemos falar do silêncio da História sobre as mulheres. Não é de espantar portanto que uma reflexão histórica participe dessa descoberta das mulheres sobre elas próprias e por elas mesmas, aspecto de sua afirmação no espaço público. Realizar essa reportagem especial é plenamente justificado porque a emancipação das mulheres, que diz respeito às relações entre os sexos, é um dos fatos maiores do século. E aqueles que se surpreendem, provavelmente não estão a par do desenvolvimento considerável dessa reflexão no mundo ocidental há um quarto de século.
De quando data na França o surgimento da história das mulheres? De uma maneira geral, do início dos anos 70, na esteira do movimento de libertação das mulheres, que teve um certo papel de estímulo. Sobretudo em torno das universidades, em todo lugar onde havia uma demanda dos estudantes e dos professores interessados em assumi-la e desenvolver as pesquisas.A título de exemplo, com a interferência da Universidade de Paris VII-Jussieu e da Escola de Altos Estudos, eis algumas datas significativas do itinerário que percorri. 1973, primeiro curso: "As mulheres possuem uma história?" cujo título interrogativo traduz as nossas perplexidades; 1983, colóquio em Saint-Maximin: "É Possível uma História das Mulheres?; 1991-92: publicação de A História das Mulheres no Ocidente. Passamos da interrogação para a afirmação já sintética de um campo.
Como nasceu esse projeto?Eu redigi essa obra em parceria com Georges Duby, que infelizmente faleceu há dois anos. Foi uma iniciativa italiana no início, de uma editora familiar – a Laterza – que havia traduzido com muito sucesso A História da Vida Privada, que Philippe Ariès e Georges Duby redigiram e na qual dirigi um volume. Essa obra coletiva reuniu setenta e dois colaboradores em torno de um forte núcleo francês sem o qual ela não teria sido possível (60% dos autores), mas aberta aos historiadores e historiadoras do mundo inteiro.Quais foram as repercussões desse novo campo nas outras disciplinas? Ele trouxe à luz novos métodos ou objetos de pesquisa?No início dos anos 70, a maior parte das pesquisadoras, mulheres ou feministas, era muito ambiciosa e falava em ruptura epistemológica. Na verdade, a história das mulheres não chegou a provocar uma verdadeira revolução. Nós utilizamos em primeiro lugar métodos e instrumentos da história clássica. Simplesmente, por causa da especificidade do assunto mulher, nós fomos levadas a desenvolver algumas práticas no campo das fontes. Recorremos mais aos arquivos particulares, aos diários íntimos, às autobiografias, já que as mulheres, durante muito tempo, não foram levadas em consideração na área pública. Apelamos também para a história oral, a fim de conhecer a vida das mulheres "comuns" que não deixaram muitos indícios.
Para vencer esse silêncio e fazer surgir o que está escondido, é preciso interessar-se também por outra coisa além do universo político, já que, durante muito tempo, as mulheres estiveram ausentes dele. É dada portanto uma tônica à vida privada, ao cotidiano, ao corpo e à medicina... Fazemos então um pouco a infra-história de nossas sociedades, o que é uma tendência da nova história e a história das mulheres, evidentemente, reforçou muito.Também é dado destaque ao estudo das imagens e das representações, porque as mulheres, em primeiro lugar, são vistas, descritas e representadas pelos homens. Trata-se em seguida de imaginar as mulheres através desses depoimentos. Isso implica um trabalho de análise crítica e desconstrução da linguagem e das imagens, que faz parte dos métodos atuais de decifração dos discursos e dos quais a história das mulheres é parte integrante no mais alto ponto. Ela serve-se dos mais contemporâneos materiais e instrumentos para atender a suas próprias necessidades. Por outro lado, a questão colocada é, por sua vez, radicalmente nova.
É próprio à história das mulheres ser muito aberta a outras disciplinas como antropologia, sociologia, literatura, psicologia...?O assunto mulher é plural e pluridisciplinar. É necessário portanto recorrer a todos os tipos de abordagem, da antropologia à psicanálise, da história das ciências à das artes. Num determinado momento, nos anos 70, em que se falou muito de pluridisciplinaridade e descompartimentação, essa atitude para nós foi evidente. Esse é um dos principais benefícios desse campo de estudos. Não se pode procurar, escrever, falar sobre as mulheres mantendo-se encerrado em uma disciplina. A questão da relação entre os sexos é decididamente transversal. Quais são os campos, a seu ver, que mereceriam as pesquisas mais urgentes?A história das mulheres começou pela de seus papéis tradicionais, de seu corpo, da maternidade. Depois, interessamo-nos muito pela educação e o trabalho das mulheres, sob todas as suas formas, do doméstico ao assalariado. Chegamos em seguida à política e à esfera pública, e a todas as formas de poder.Entre as áreas de vanguarda está a da relação das mulheres com a criação, seja na pintura, na música, ou mesmo nas ciências que resistem, principalmente as ciências "duras", à entrada das mulheres e têm tendência a se reconstituir como diques de excelência, de poder e de exercício masculinos.Outra área ainda muito pouco explorada é a da violência contra as mulheres – o corpo aviltado, violentado, submetido, explorado –, que é acobertada pelo pudor tradicional e conseqüentemente pelo retraimento das mulheres que se sentem culpadas. Esse é um silêncio típico exercido ainda hoje sobre as palavras das mulheres. Atualmente são feitas pesquisas para tentar compreender, por exemplo, o silêncio das mulheres diante da violência da qual elas são vítimas e a reação da justiça face àquelas que apresentam queixa.A senhora acha que se a história das mulheres fosse mais desenvolvida nesses temas, ela teria conseqüências sobre a violência sofrida pelas mulheres hoje?Sim. Tomar consciência de que o que lhe acontece não é único, na medida em que existe também uma dimensão compartilhada, coletiva, oculta, pode ser útil. As mulheres têm necessidade de se inscrever na duração, no tempo, de pensar que elas possuem uma história, para o melhor e para o pior. Como viviam minha mãe, minha avó, minhas antepassadas, o que elas me transmitiram, o que elas sofreram mas também realizaram? Como vivem as outras mulheres em outros lugares?Como a senhora explica que o feminismo tenha uma má repercussão na imprensa francesa e mesmo junto às mulheres? Isso estaria ligado à ignorância das mulheres de sua própria história e do papel do feminismo na conquista da igualdade de direitos?O feminismo é malvisto por toda parte. Porque ele contesta a ordem estabelecida, tão fortemente patriarcal. Mas é verdade que na França ele é especialmente denegrido, ou – pior ainda – negado em sua própria existência, sendo considerado incompatível com o "temperamento" das mulheres francesas. É que o modelo nacional de relação entre os sexos é construído em torno da idéia de "viver com calma", fazer a corte, galanteria, até mesmo de uma viril maneira de ser gaulesa para com as mulheres "gentis", agradáveis e permissivas. Os "grandes homens" do Panteão contrastam com as "pequenas mulheres" de Paris: casal ideal típico. Entre nós não há guerra de sexos. Toda reavaliação dessa regra do jogo cultural é vivida como uma agressão, uma má atitude de um feminismo vindo de fora, sobretudo americano, caricaturado.Por outro lado, a imagem de um casal feliz e complementar, a idéia de sedução é tão forte entre nós que muitas mulheres não têm vontade de enfrentá-la, de serem catalogadas de "feministas", ou seja reivindicatórias, ou pouco femininas, para ser mais exata. Esquecidas das lutas do passado, muitas jovens dizem com naturalidade "Eu não sou feminista, mas...". O que significa que elas pretendem manter-se à distância desse feminismo "excessivo", reconhecendo ao mesmo tempo que no fundo elas lhe devem alguma coisa.Esse complexo feminista (ou antifeminista) tem como resultado um esquecimento do feminismo. A melhora da "condição" das mulheres e o progresso em direção a uma maior igualdade seriam o fruto da única modernização, científica (a pílula, por exemplo) e política (benefícios da democracia), esquecendo-se completamente que foram necessárias muitas lutas para se chegar a vencer os obstáculos. As mulheres têm muita dificuldade para constituir a sua memória, para operar a sua transmissão. O papel da história das mulheres, além de sua exigência de verdade, é também o de lutar contra a maré de silêncio, que sempre recomeça.Como a senhora julgaria o período atual na França e no mundo?Existem progressos decisivos: trabalho, liberdades privadas, igualdade de formação e de acesso às profissões, início da paridade na política, surgimento de novas áreas de criação, de esporte de alto nível, etc. Mas, olhando de perto, podemos constatar resistências, desigualdades flagrantes (desemprego, trabalho em meio período, famílias monoparentais na verdade femininas e empobrecidas, etc.) e áreas de excelência que resistem às mulheres. Principalmente a nível mundial, existem retrocessos nacionalistas, avanços do integrismo religioso do qual as mulheres são em toda parte o alvo principal.É verdade que existem algumas brechas por toda parte. As próprias africanas lutam contra a excisão, tanto na França (processo recente) quanto na África mesmo. Na Índia, é cada vez maior o número de mulheres que lutam contra as discriminações das quais são vítimas. Assim como no Japão e na América Latina. Os modelos de feminilidade moderna e democrática estão se difundindo por todo o mundo.As resistências têm a medida desse movimento porque a emancipação das mulheres assusta os homens, encrespados no que diz respeito a seus poderes, pessoais na família ou políticos na cidade. Toda volta à calma é operada primeiramente através do silêncio imposto às mulheres. Donde a força simbólica que é a mulher coberta com o véu.A senhora acha que o medo da indiferenciação sexual nos homens estaria na origem dessas violências ou dessa repressão das mulheres e de sua emancipação. Por quê? No fundo, para os homens, o Outro é a mulher. Se ela não está presente, o que é a virilidade? O que é a dominação? Tanto na vida política quanto na vida simbólica ou no poder. Podemos dizer que o poder masculino existe apenas através do que ele domina, portanto de forma majoritária, as mulheres. Na família também. Assusta muito os homens ver mulheres que não se deixariam dominar, no sentido tradicional.Isso assusta menos as mulheres. Por quê? Porque elas têm menos problemas com a sua feminilidade, elas a vivem, sentem-se mulheres e querem permanecer sendo, em condições de igualdade. A igualdade na diferença talvez esteja na grande reivindicação atual.Assim sendo, é preciso estar atento ao fato de que um número crescente de homens experimenta um grande cansaço em relação ao modelo viril. Existem homens "doces" que assumem uma posição de recuo em relação à supervirilização da competição, do dopping, do sucesso a qualquer preço. Será que não existem outras formas de afirmação pessoal, de relação com o outro, de cidadania cotidiana? Sem dúvida é mais fácil nos meios relativamente abastados e sobretudo cultos. Mais difícil nos meios desfavorecidos, onde, para se afirmar, domina-se o próximo, vizinho ou parente; e em primeiro lugar as mulheres, que podem ser objeto de violência cotidiana.Seria uma contribuição do feminismo o fato de os homens poderem libertar-se do modelo viril?Esta seria uma conseqüência totalmente positiva do feminismo. No campo das ciências humanas, as pesquisas sobre a virilidade análoga aos "gender studies" americanos, desenvolvem-se sobretudo em sociologia e história. Temos visto os historiadores desenvolvendo trabalhos sobre os homens violentos, o estupro, a história do serviço militar, os ritos da masculinidade, etc. Esse é um campo novo que indica uma nova reflexão. O fato de as mulheres tornarem-se elas mesmas sujeitos remete os homens a sua própria identidade?Sim. Porque isso pressupõe que as identidades sexuais são, não naturais e determinadas de uma única vez, e sim elaboradas pela cultura e pela história. Existe uma historicidade da relação entre os sexos que pode ser libertadora para cada um, homem ou mulher, livre para construir sua identidade, da qual o sexo não é, no final das contas, senão um elemento.Poderíamos inverter com toda a fidelidade a fórmula de Simone de Beauvoir ("Não se nasce mulher, torna-se"). Nasce-se homem ou mulher. Esse corpo é imediatamente tomado por redes de significações das quais é preciso se desembaraçar para não ficar marcado. Em seguida, reencontrar esse corpo e suas imensas virtualidades. Talvez nosso corpo nos seja desconhecido e nós tenhamos que descobri-lo e reinventá-lo como no primeiro dia da criação! E a pessoa está além do corpo.


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