Petróleo: emerge uma nova ordem energética mundial 28/06/08 Artigo de Humberto Marquez da IPS

A reunião informal de Domingo passado na cidade saudita de Jeddah, com representantes de governos e de grandes empresas petrolíferas, pediu mais investimentos para desenvolver a produção de crude e derivados, mas também "maior transparência dos mercados financeiros" de onde afluem recursos que compram o produto para o futuro e fazem disparar os preços".
O encontro de Jeddah será repetido no final do ano em Londres e, entretanto, produtores e consumidores, mais empresas, vão-se encontrar novamente na próxima semana em Madrid, que albergará o 19.º Congresso Mundial do Petróleo.O ministro espanhol da Indústria, Miguel Sebastián, disse que "após desfrutar durante 15 anos de preços baixos, as nossas economias voltaram a ser dependentes do petróleo e o mundo não está preparado para o repto de uma progressiva subida do seu preço".Sebastián disse que "a natureza foi generosa com os membros da OPEP, mas essa dádiva implica responsabilidade com a economia global", melhorando a oferta, enquanto os países industrializados "deveriam reformar em profundidade os mercados de matérias-primas para evitar bolhas especulativas".A OPEP é integrada por Angola, Arábia Saudita, Equador, Emiratos Árabes Unidos, Indonésia, Irão, Iraque, Kuwait, Líbia, Nigéria, Qatar e Venezuela, e o seu subsolo possui mais de 75% das reservas petrolíferas do planeta.
O diário de Caracas El Nacional recordou a propósito da reunião de Jeddah que o chamado "pai da OPEP", o venezuelano Juan Pablo Pérez Alonso, propôs há meio século uma entidade de produtores e consumidores que regulasse o comércio mundial dos hidrocarbonetos.
As corporações que controlavam o negócio, conhecidas como as "sete irmãs", desdenharam da proposta e os Estados produtores criaram então a OPEP, fundada em 1960 em Bagdade por Arábia Saudita, Irão, Iraque, Kuwait e Venezuela.

Talvez por isso, para mostrar que Riade não é a única voz da OPEP, o presidente da organização e ministro do petróleo da Argélia, Chakib Jelil, disse na Europa que o preço do petróleo, ainda que não suba até aos 200 dólares por barril, "provavelmente chegará a um valor entre 150 e 170 dólares durante este Verão".Mas, se por exemplo, a crise do programa nuclear do Irão levasse a que esse país suspendesse a sua produção, hoje de 4,4 milhões de barris diários, "gerar-se-ia uma grave situação de falta de abastecimento e os preços chegariam a 300 ou 400 dólares", disse Jelil.
Enquanto estas declarações davam a volta ao mundo, o porta-voz para o petróleo da Líbia, Shokri Ghanem, disse que o seu país poderia diminuir a produção de crude para protestar por uma lei que os Estados Unidos estão a debater, segundo a qual o seu Departamento de Justiça poderia pedir aos membros da OPEP para diminuir produção ou "cartelizar" preços.Tripoli também resiste a uma lei norte-americana que autoriza os familiares das vítimas de ataques terroristas que se comprove que tenham estado ligados à Líbia a solicitarem a penhora de bens desse país norte-africano ou de companhias que façam negócios com esse governo.Estas declarações empurraram os preços da véspera, para o recorde dos 140 dólares. Ainda que a Líbia apenas produza 1,8 milhões de barris, o que equivale a dois por cento da procura mundial, os operadores consideram que cada barril conta para alterar os preços.Por isso, no cenário de Jeddah, o secretário geral da OPEP, o líbio Abdallah el-Badri, disse que a organização prevê investir 160.000 milhões de dólares nos próximos cinco anos, para acrescentar à oferta cinco milhões de barris diários.A OPEP produz cerca de 32 milhões de barris por dia de petróleo, enquanto que a oferta mundial atinge os 86 milhões de unidades.O especialista venezuelano Pablo Hernández Parra sustenta que a procura mundial será no início da próxima década de mais de 92 milhões de barris por dia de petróleo, dos quais a OPEP não poderá fornecer mais de 38 milhões de unidades, enquanto o resto do mundo fornecerá cerca de 49 milhões.O défice, de vários milhões de barris diários, não poderá ser coberto pela OPEP, porque falsificou dados sobre as suas reais reservas e sobre a capacidade de expandir a produção. "A única saída é uma sociedade nova que tenha como objectivo reduzir o actual consumo energético e conservar o que nos resta de ambiente", segundo Hernández Parra.O norte-americano Joseph Stiglitz, prémio Nobel da Economia em 2001, escreveu esta semana que "só modificando os padrões de consumo e de produção - com um novo modelo económico, na realidade - poderemos fazer frente ao problema prioritário dos recursos básicos"."Dois factores desencadearam a crise actual: a guerra do Iraque impulsionou a escalada dos preços do petróleo e, por outro lado, o aparecimento dos biocombustíveis faz com que os mercados agro-alimentar e energético estejam mais ligados", apontou Stiglitz.Nos Estados Unidos, "os subsídios ao etanol extraído do milho contribuíram mais para encher os cofres dos produtores do que para reduzir o aquecimento global", lamentou, depois de advogar que os países ricos eliminem ou reduzam as políticas energéticas e agrícolas que provocam distorções e que ajudem as nações pobres.Nestas, a escalada dos preços do petróleo adquire proporções de pesadelo. Na abertura do encontro de Jeddah, o rei saudita Abdulá Bin Abdulaziz propôs que a OPEP estabeleça um fundo de 1.500 milhões de dólares para compensar a carga que os elevados preços do crude representam para os países pobres.
A situação da região foi ilustrada pelo Ministro das Finanças da República Dominicana, Vicente Bengoa: "Em 2004, a factura petrolífera era coberta com as remessas dos emigrantes dominicanos e sobravam 560 milhões de dólares, enquanto que este ano se prevê uma entrada de remessas no montante de 1.900 milhões de dólares e uma factura petrolífera de 4.500 milhões".As corporações globais petrolíferas, entretanto, arrecadaram lucros de dezenas de milhares de milhões de dólares, cada uma. Com essas entradas, sustenta Poleo, o capital global financia o seu posicionamento perante as mudanças em marcha na matriz energética mundial. A favor desses interesses, a bolha de preços continua a inchar, ainda que analistas como Alexander Green, da rede de consultoria norte-americana Oxford Clube, insistam em que os actuais valores do crude são insustentáveis e necessariamente baixarão.Green comparou 2.391 dias de subidas no preço do petróleo, desde Novembro de 2001, com os 2.086 de aumento do índice Nasdaq da bolsa e com os 1.954 dos construtores de habitações. Estes últimos casos foram seguidos de 943 e 902 dias de baixa.

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