entrevista Gilles Deleuze 19/08/07
http://www.youtube.com/watch?v=AxAOHez4meA Arnaud Villani – Você é um “monstro”? Gilles Deleuze – “Monstro” é, para começar, um ser composto. E é verdade que escrevi sobre assuntos aparentemente variados. “Monstro” tem um segundo sentido: alguma coisa ou qualquer um cuja extrema determinação deixa plenamente subsistir o indeterminado (por exemplo, um
monstro ao estilo de Goya). Nesse sentido, o pensamento é um monstro.AV – A physis parece exercer um grande papel em sua obra.GD – Você tem razão, creio que eu giro em torno de uma certa idéia da Natureza, mas não
cheguei ainda a considerar essa noção diretamente.
AV – Pode-se designá-lo como “sofista”, no bom sentido, e o antilogos, trata-se de um retorno,para além do golpe de força de Platão contra os sofistas?GD – Não. O antilogos, para mim, está menos ligado à astúcia no sentido dos sofistas do que aoinvoluntário de Proust.AV – O pensamento é, na sua obra, “espermático. Ele tem uma relação clara, nesse sentido, com a sexualidade?GD – Isso é verdade até Lógica do sentido, no qual existe ainda uma relação enunciável entresexualidade e metafísica. Depois, a sexualidade me parece, antes, uma abstração mal fundada.AV – Pode-se modelizar a sua evolução por meio de sínteses?GD – Vejo a minha evolução de forma diferente. Você conhece a “Carta a Michel Cressole”: é aí que explico minha evolução tal como a vejo.AV – O pensamento como audácia e aventura?GD – Naquilo que escrevi, creio muito nesse problema da imagem do pensamento e num pensamento liberto da imagem. É já Diferença e repetição, mas também em Proust, e ainda Mil platôs.AV – Você tem uma capacidade para encontrar, apesar de tudo e de todos, os verdadeiros problemas.GD – Se isso for verdadeiro é porque eu acredito na necessidade de construir um conceito do problema. Tentei em Diferença e repetição e gostaria de retomar essa questão. Mas praticamente isso me leva a buscar, em cada caso, como um problema pode ser colocado. É dessa maneira,parece-me, que a filosofia deve ser considerada como uma ciência: determinar as condições de um problema.AV – Há um início de rizoma Deleuze – Guattari – Foucault – Lyotard – Klossowski – etc.?GD – Isso poderia ter sido feito, mas não se fez. Na verdade, só há rizoma entre Félix e mim.AV – A conclusão de Mil platôs consiste em um modelo topológico radicalmente original em filosofia. Ele é traduzível matematicamente, biologicamente? GD – A conclusão de Mil platôs é, na minha cabeça, uma tabela de categorias (mas incompleta,insuficiente). Não à maneira de Kant, mas à maneira de Whitehead. Categoria assume, pois, um novo sentido, muito especial. Eu gostaria de trabalhar esse ponto. Você pergunta se há transposição matemática e biológica possível. É provavelmente o inverso. Sinto-me bergsoniano, quando Bergson diz que a ciência moderna não encontrou sua metafísica, a metafísica que ela necessitaria. É essa metafísica que me interessa.AV – Pode-se dizer que um amor pela vida, em sua amedrontadora complexidade, o conduz ao longo de toda a sua obra?GD – Sim. O que me desgosta, teoricamente, praticamente, é toda espécie de queixa relativamente à vida, toda cultura trágica, isto é, a neurose. Suporto muito mal as neuroses.AV – Você é um filósofo não-metafísico?GD – Não, eu me sinto um puro metafísico.AV – Um século, para você, poderá ser deleuziano, leve? Ou você é pessimista sobre a possibilidade de se livrar da identidade e do poder dos traços?GD – Não, não sou, de forma alguma, pessimista porque não creio na irreversibilidade das situações. Tomemos o estado catastrófico atual da literatura e do pensamento. Isso não me parece grave para o futuro.AV – Depois de Mil platôs?
GD – Terminei agora um livro sobre Francis Bacon e só tenho agora dois projetos: um sobre
“Pensamento e cinema” e um outro será um livro grande sobre “O que é a filosofia?” (com o
problema das categorias).AV – O mundo é duplo, macrofísico (e a imagem do pensamento aí funciona muito bem) e microfísico (é o seu modelo que, há anos, depois da mesma revolução em ciência, em arte, dá conta disso). Há uma relação polêmica entre esses dois pontos de vista?
GD – A distinção entre o macro e o micro é muito importante, mas ela pertence mais a Félix que a mim. A mim toca, antes, a distinção entre dois tipos de multiplicidade. Isso é o essencial para
mim: o fato de que um desses dois tipos remete às micromultiplicidades não passa de uma
conseqüência. A mesma coisa para o problema do pensamento, e mesmo para as ciências, a
noção de multiplicidade, tal como é introduzida por Riemann, me parece mais importante que a da microfísica.
texto de deleuze sobre os Mil platôs:Os anos passam, os livros envelhecem, ou, ao contrário, adquirem uma segunda
juventude. Ora eles se espessam e incham, ora eles modificam seus traços, acusam suas arestas,fazem subir à superfície novos planos. Não cabe aos autores determinar um determinado destino objetivo. Mas cabe a eles refletir sobre o lugar que um determinado livro adquiriu com o tempo no conjunto de seu projeto (destino subjetivo), ao passo que ele ocupava todo o seu projeto no momento em que foi escrito.Mil platôs (1980) é a seqüência de O Anti-Édipo (1972). Mas eles têm tido, objetivamente,destinos muito diferentes. Sem dúvida, por razões de contexto: a época agitada de um, que faz ainda parte de 68, e a calma já monótona, a indiferença em que o outro surgiu. Mil platôs foi o mais mal recebido de nossos livros. Entretanto, se nós o preferimos, não é como uma mãe prefere seu filho pouco gracioso. O Anti-Édipo teve muito sucesso, mas esse sucesso se replicava em um fracasso mais profundo. Ele pretendia denunciar os estragos de Édipo, do “papai-mamãe”, na
psicanálise, na psiquiatria e mesmo na anti-psiquiatria, na crítica literária, e na imagem geral que se faz do pensamento. Nós sonhávamos em acabar com Édipo. Mas era uma tarefa demasiadamente grande para nós. A reação contra 68 deveria mostrar a que ponto o Édipo familial se portava bem e continuava a impor seu regime de lamúria pueril na psicanálise, na literatura e em todas as partes do pensamento. Ainda que o Anti-Édipo permanecesse nosso projétil. Ao passo que Mil platôs, malgrado seu fracasso aparente, nos fazia dar um passo adiante,ao menos para nós, e abordar terras desconhecidas, virgens de Édipo, que o Anti-Édipo tinha visto apenas de longe sem penetrá-las.Os três temas de O Anti-Édipo eram os seguintes:1) O inconsciente funciona como uma fábrica e não como um teatro (questão de produção e não de representação);2) O delírio, ou o romance, é histórico-mundial e não familial (deliramos as raças, as tribos,os continentes, as culturas, as posições sociais...);3) Há, precisamente, uma história universal, mas é a da contingência (como os fluxos, que
são o objeto da História, passam por códigos primitivos, por sobrecodificações despóticas e por
descodificações capitalistas que tornam possível uma conjunção de fluxos independentes).
O Anti-Édipo tinha uma ambição kantiana, era preciso tentar uma espécie de Crítica da
razão pura no nível do inconsciente. Daí a determinação de sínteses próprias ao inconsciente; o
desenrolamento da história como efetuação dessas sínteses; a denúncia do Édipo como “ilusão
inevitável”, falsificando toda produção histórica.Mil platôs reivindica, ao contrário, uma ambição pós-kantiana (ainda que decisivamente anti-hegeliana). O projeto é “construtivista”. É uma teoria das multiplicidades por si mesmas, ali onde o múltiplo passa ao estado de substantivo, enquanto que o Anti-Édipo o considerava ainda nas sínteses e sob as condições do inconsciente. Em Mil platôs, o comentário sobre o Homem dos Lobos (“um só ou vários lobos”) constitui nosso adeus à psicanálise, e tenta mostrar como as multiplicidades extravasam a distinção entre a consciência e o inconsciente, entre a natureza e a história, entre o corpo e a alma. As multiplicidades são a realidade mesma, e não supõem nenhuma unidade, não entram em nenhuma totalidade, assim como não remetem a nenhum sujeito. As subjetivações, as totalizações, as unificações são, ao contrário, processos que produzem e aparecem nas multiplicidades. As principais características das multiplicidades dizem respeito a seus elementos, que são singularidades: suas relações, que são devires, seus acontecimentos, que são hecceidades (isto é, individuações sem sujeito); seus espaços-tempos,que são espaços e tempos lisos; seu modelo de realização, que é o rizoma (por oposição ao modelo da árvore); seu plano de composição que constitui platôs (zonas de intensidade contínua);os vetores que os atravessam, e que constituem territórios e graus de desterritorialização.A história universal da contingência ganha aí uma maior variedade. Em cada caso, a questão é: onde e como se faz esse reencontro? Em vez de seguir, como em O Anti-Édipo, a sucessão tradicional Selvagens-Bárbaros-Civilizados, nós nos encontramos agora diante de toda a espécies de formações coexistentes: os grupos primitivos, que operam por séries, e por avaliação do “último” termo, em um estranho marginalismo; as comunidades despóticas, que constituem, ao contrário, conjuntos submetidos a processos de centralização (aparelhos de Estado); as máquinas de guerra nômades, que não se apoderarão dos Estados sem que esses não se apropriem da máquina de guerra que eles não tinham inicialmente; os processos de subjetivação que se exercem nos aparelhos estatais e guerreiros; a efetuação da convergência entre esses processos,no capitalismo e através dos Estados correspondentes; as modalidades de uma ação revolucionária; os fatores comparados, em cada caso, do território, da terra e da desterritorialização.Os três fatores, pode-se vê-los aqui jogar livremente, isto é, esteticamente, no ritornelo. As pequenas canções territoriais, ou canto dos pássaros; o grande canto da terra, quando a terra urrou; a possante harmonia das esferas ou a voz do cosmo? É exatamente isso que este livro queria: agenciar ritornelos, lieder, correspondendo a cada platô. Porque a filosofia, também ela,não é outra coisa: da pequena canção ao mais possante dos cantos – uma espécie de sprechgesang [canção falada] cósmico. O pássaro de Minerva (para falar como Hegel) tem seus gritos e seus cantos; os princípios em filosofia são gritos, em tornos dos quais os conceitos desenvolvem verdadeiros cantos.
monstro ao estilo de Goya). Nesse sentido, o pensamento é um monstro.AV – A physis parece exercer um grande papel em sua obra.GD – Você tem razão, creio que eu giro em torno de uma certa idéia da Natureza, mas não
cheguei ainda a considerar essa noção diretamente.
AV – Pode-se designá-lo como “sofista”, no bom sentido, e o antilogos, trata-se de um retorno,para além do golpe de força de Platão contra os sofistas?GD – Não. O antilogos, para mim, está menos ligado à astúcia no sentido dos sofistas do que aoinvoluntário de Proust.AV – O pensamento é, na sua obra, “espermático. Ele tem uma relação clara, nesse sentido, com a sexualidade?GD – Isso é verdade até Lógica do sentido, no qual existe ainda uma relação enunciável entresexualidade e metafísica. Depois, a sexualidade me parece, antes, uma abstração mal fundada.AV – Pode-se modelizar a sua evolução por meio de sínteses?GD – Vejo a minha evolução de forma diferente. Você conhece a “Carta a Michel Cressole”: é aí que explico minha evolução tal como a vejo.AV – O pensamento como audácia e aventura?GD – Naquilo que escrevi, creio muito nesse problema da imagem do pensamento e num pensamento liberto da imagem. É já Diferença e repetição, mas também em Proust, e ainda Mil platôs.AV – Você tem uma capacidade para encontrar, apesar de tudo e de todos, os verdadeiros problemas.GD – Se isso for verdadeiro é porque eu acredito na necessidade de construir um conceito do problema. Tentei em Diferença e repetição e gostaria de retomar essa questão. Mas praticamente isso me leva a buscar, em cada caso, como um problema pode ser colocado. É dessa maneira,parece-me, que a filosofia deve ser considerada como uma ciência: determinar as condições de um problema.AV – Há um início de rizoma Deleuze – Guattari – Foucault – Lyotard – Klossowski – etc.?GD – Isso poderia ter sido feito, mas não se fez. Na verdade, só há rizoma entre Félix e mim.AV – A conclusão de Mil platôs consiste em um modelo topológico radicalmente original em filosofia. Ele é traduzível matematicamente, biologicamente? GD – A conclusão de Mil platôs é, na minha cabeça, uma tabela de categorias (mas incompleta,insuficiente). Não à maneira de Kant, mas à maneira de Whitehead. Categoria assume, pois, um novo sentido, muito especial. Eu gostaria de trabalhar esse ponto. Você pergunta se há transposição matemática e biológica possível. É provavelmente o inverso. Sinto-me bergsoniano, quando Bergson diz que a ciência moderna não encontrou sua metafísica, a metafísica que ela necessitaria. É essa metafísica que me interessa.AV – Pode-se dizer que um amor pela vida, em sua amedrontadora complexidade, o conduz ao longo de toda a sua obra?GD – Sim. O que me desgosta, teoricamente, praticamente, é toda espécie de queixa relativamente à vida, toda cultura trágica, isto é, a neurose. Suporto muito mal as neuroses.AV – Você é um filósofo não-metafísico?GD – Não, eu me sinto um puro metafísico.AV – Um século, para você, poderá ser deleuziano, leve? Ou você é pessimista sobre a possibilidade de se livrar da identidade e do poder dos traços?GD – Não, não sou, de forma alguma, pessimista porque não creio na irreversibilidade das situações. Tomemos o estado catastrófico atual da literatura e do pensamento. Isso não me parece grave para o futuro.AV – Depois de Mil platôs?
GD – Terminei agora um livro sobre Francis Bacon e só tenho agora dois projetos: um sobre
“Pensamento e cinema” e um outro será um livro grande sobre “O que é a filosofia?” (com o
problema das categorias).AV – O mundo é duplo, macrofísico (e a imagem do pensamento aí funciona muito bem) e microfísico (é o seu modelo que, há anos, depois da mesma revolução em ciência, em arte, dá conta disso). Há uma relação polêmica entre esses dois pontos de vista?
GD – A distinção entre o macro e o micro é muito importante, mas ela pertence mais a Félix que a mim. A mim toca, antes, a distinção entre dois tipos de multiplicidade. Isso é o essencial para
mim: o fato de que um desses dois tipos remete às micromultiplicidades não passa de uma
conseqüência. A mesma coisa para o problema do pensamento, e mesmo para as ciências, a
noção de multiplicidade, tal como é introduzida por Riemann, me parece mais importante que a da microfísica.
texto de deleuze sobre os Mil platôs:Os anos passam, os livros envelhecem, ou, ao contrário, adquirem uma segunda
juventude. Ora eles se espessam e incham, ora eles modificam seus traços, acusam suas arestas,fazem subir à superfície novos planos. Não cabe aos autores determinar um determinado destino objetivo. Mas cabe a eles refletir sobre o lugar que um determinado livro adquiriu com o tempo no conjunto de seu projeto (destino subjetivo), ao passo que ele ocupava todo o seu projeto no momento em que foi escrito.Mil platôs (1980) é a seqüência de O Anti-Édipo (1972). Mas eles têm tido, objetivamente,destinos muito diferentes. Sem dúvida, por razões de contexto: a época agitada de um, que faz ainda parte de 68, e a calma já monótona, a indiferença em que o outro surgiu. Mil platôs foi o mais mal recebido de nossos livros. Entretanto, se nós o preferimos, não é como uma mãe prefere seu filho pouco gracioso. O Anti-Édipo teve muito sucesso, mas esse sucesso se replicava em um fracasso mais profundo. Ele pretendia denunciar os estragos de Édipo, do “papai-mamãe”, na
psicanálise, na psiquiatria e mesmo na anti-psiquiatria, na crítica literária, e na imagem geral que se faz do pensamento. Nós sonhávamos em acabar com Édipo. Mas era uma tarefa demasiadamente grande para nós. A reação contra 68 deveria mostrar a que ponto o Édipo familial se portava bem e continuava a impor seu regime de lamúria pueril na psicanálise, na literatura e em todas as partes do pensamento. Ainda que o Anti-Édipo permanecesse nosso projétil. Ao passo que Mil platôs, malgrado seu fracasso aparente, nos fazia dar um passo adiante,ao menos para nós, e abordar terras desconhecidas, virgens de Édipo, que o Anti-Édipo tinha visto apenas de longe sem penetrá-las.Os três temas de O Anti-Édipo eram os seguintes:1) O inconsciente funciona como uma fábrica e não como um teatro (questão de produção e não de representação);2) O delírio, ou o romance, é histórico-mundial e não familial (deliramos as raças, as tribos,os continentes, as culturas, as posições sociais...);3) Há, precisamente, uma história universal, mas é a da contingência (como os fluxos, que
são o objeto da História, passam por códigos primitivos, por sobrecodificações despóticas e por
descodificações capitalistas que tornam possível uma conjunção de fluxos independentes).
O Anti-Édipo tinha uma ambição kantiana, era preciso tentar uma espécie de Crítica da
razão pura no nível do inconsciente. Daí a determinação de sínteses próprias ao inconsciente; o
desenrolamento da história como efetuação dessas sínteses; a denúncia do Édipo como “ilusão
inevitável”, falsificando toda produção histórica.Mil platôs reivindica, ao contrário, uma ambição pós-kantiana (ainda que decisivamente anti-hegeliana). O projeto é “construtivista”. É uma teoria das multiplicidades por si mesmas, ali onde o múltiplo passa ao estado de substantivo, enquanto que o Anti-Édipo o considerava ainda nas sínteses e sob as condições do inconsciente. Em Mil platôs, o comentário sobre o Homem dos Lobos (“um só ou vários lobos”) constitui nosso adeus à psicanálise, e tenta mostrar como as multiplicidades extravasam a distinção entre a consciência e o inconsciente, entre a natureza e a história, entre o corpo e a alma. As multiplicidades são a realidade mesma, e não supõem nenhuma unidade, não entram em nenhuma totalidade, assim como não remetem a nenhum sujeito. As subjetivações, as totalizações, as unificações são, ao contrário, processos que produzem e aparecem nas multiplicidades. As principais características das multiplicidades dizem respeito a seus elementos, que são singularidades: suas relações, que são devires, seus acontecimentos, que são hecceidades (isto é, individuações sem sujeito); seus espaços-tempos,que são espaços e tempos lisos; seu modelo de realização, que é o rizoma (por oposição ao modelo da árvore); seu plano de composição que constitui platôs (zonas de intensidade contínua);os vetores que os atravessam, e que constituem territórios e graus de desterritorialização.A história universal da contingência ganha aí uma maior variedade. Em cada caso, a questão é: onde e como se faz esse reencontro? Em vez de seguir, como em O Anti-Édipo, a sucessão tradicional Selvagens-Bárbaros-Civilizados, nós nos encontramos agora diante de toda a espécies de formações coexistentes: os grupos primitivos, que operam por séries, e por avaliação do “último” termo, em um estranho marginalismo; as comunidades despóticas, que constituem, ao contrário, conjuntos submetidos a processos de centralização (aparelhos de Estado); as máquinas de guerra nômades, que não se apoderarão dos Estados sem que esses não se apropriem da máquina de guerra que eles não tinham inicialmente; os processos de subjetivação que se exercem nos aparelhos estatais e guerreiros; a efetuação da convergência entre esses processos,no capitalismo e através dos Estados correspondentes; as modalidades de uma ação revolucionária; os fatores comparados, em cada caso, do território, da terra e da desterritorialização.Os três fatores, pode-se vê-los aqui jogar livremente, isto é, esteticamente, no ritornelo. As pequenas canções territoriais, ou canto dos pássaros; o grande canto da terra, quando a terra urrou; a possante harmonia das esferas ou a voz do cosmo? É exatamente isso que este livro queria: agenciar ritornelos, lieder, correspondendo a cada platô. Porque a filosofia, também ela,não é outra coisa: da pequena canção ao mais possante dos cantos – uma espécie de sprechgesang [canção falada] cósmico. O pássaro de Minerva (para falar como Hegel) tem seus gritos e seus cantos; os princípios em filosofia são gritos, em tornos dos quais os conceitos desenvolvem verdadeiros cantos.
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