Um dever dos lutadores do povo
O pretexto foi o caso do "Dossiê Vedoin", filho das práticas escusas do PSDB e outros partidos, e da ilimitada estupidez e arrogância arrivista de um grupo de petistas. A senha de ordem unida e ataque foi a conclamação do senador Jorge Bornhausen (PFL) de que precisamos acabar com essa raça", secundada pelo brado do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em prol do renascimento do lacerdismo (de acordo com o líder tucano, falta ao Brasil um Carlos Lacerda – o grande articulador das tentativas de golpe da direita brasileira desde os anos 1950, até conseguir sucesso em 1964). Meio a tudo isso, os Clubes Militares (Exército, Marinha e Aeronáutica) fazem circular uma nota-manifesto onde externam sua preocupação com a corrupção e a ética. Para completar o quadro, a mídia conservadora faz soar sua fanfarra no mais alto volume, criminalizando aparentemente apenas o governo Lula, quando na verdade pretende, sobretudo, desqualificar e desmoralizar a esquerda e os trabalhadores: "acabar com essa raça". Assim, unificada de última hora em torno da candidatura de Geraldo Alckmin (do PSDB e da Opus Dei), a direita histórica liderada pelos Bornhausen, aliada à direita moderna e tecnocrática representada pelas principais lideranças tucanas; respaldada pelos militares mais reacionários das nossas Forças Armadas e servida por uma das mais corruptas imprensas do mundo, foi para a ofensiva e cavou um segundo turno na disputa presidencial. Trata-se da mesma aliança que manda no país desde sua descoberta, pois, como diz o governador pefelista de São Paulo, seu partido chegou e está no poder no Brasil desde que aqui aportaram as caravelas. A aliança de classes e forças que instituiu a escravidão e a corrupção no país, e que hoje hipocritamente afeta sentir-se escandalizada. O mesmo bloco que durante os oito anos de Governo Fernando Henrique Cardoso- Marco Maciel capitaneou a implantação das cláusulas neoliberais em nosso país, desmontando o Estado e privatizando a empresas públicas.
A esquerda é contra a apropriação do público por quem quer que seja: indivíduos, famílias, empresas, associações ou partidos. Por isso, é contra toda privatização. Que se apurem todas as corrupções. Mas, TODAS. Que se apurem todas as privatizações. Um balanço dos quatro anos de mandato do presidente Lula deixa um decepcionante saldo para a classe trabalhadora, sobretudo no que diz respeito à economia. Mais que isso, tendo em vista a nova composição do Congresso Nacional e as alianças em curso desde o primeiro mandato, a tendência é que o segundo governo Lula esteja ainda mais comprometido com a agenda neoliberal, principalmente caso se aprofunde ou se mantenha o descenso das lutas populares e de massas. No entanto, é preciso ter claro que, em nenhum momento, as forças que o apóiam vieram a público, ou sequer insinuaram o uso da força e a quebra das atuais instituições democráticas (ainda que frágeis e limitadas), que permitem que nos organizemos e acumulemos forças para aprofundar conquistas e realizar as mudanças estruturais de que necessita a classe trabalhadora e o povo. Diferentemente do que se propala, os trabalhadores, o povo e a esquerda brasileira foram os principais fiadores dessas instituições. A abertura e a transição para a democracia que se preparava entre as elites no final da ditadura seria mais estreita e minguada, não fossem as grandes greves e manifestações, preparadas por um persistente e clandestino trabalho da esquerda (marxista e cristã), de organização de comissões de fábricas e empresas, de organização dos bairros proletários, de movimentos populares e de retomada das entidades (sindicatos e associações) de trabalhadores ocupadas por interventores e prepostos do regime desde o golpe de 1964. Foi o povo na rua, articulado por suas organizações e movimentos, quem definiu as conquistas mais avançadas de que hoje usufruímos e que se inscreveram na Constituição de 1988. Não devemos isso, nem às elites, nem a qualquer guia genial dos povos, a qualquer pai dos pobres. É preciso lembrar a História, a nossa História. É preciso lembrar que muitos foram assassinados para que conquistássemos e garantíssemos a liberdade que hoje gozamos, ainda que precária, mas que nos garante o direito inclusive de escrever este editorial. É preciso, sobretudo, abandonarmos uma discussão economicista da atual conjuntura e distinguirmos bem quem é o inimigo principal, quem são os adversários e quais são os nossos aliados. Toda vez que nos equivocamos a esse respeito, acabamos derrotados. Hoje,o inimigo principal é o bloco que se aglutina em torno da candidatura Geraldo Alckmin. É esse, portanto, que deve ser derrotado nas atuais eleições.
Assim, votar Lula, mesmo sem qualquer ilusão no que diz respeito a sua política econômica, é um dever de todos nós que constituímos a classe trabalhadora e o povo brasileiro. O contrário é apostar no quanto pior, melhor. E o pior só é melhor quando é pior para o inimigo.
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