Brasil:50 empresas controlam preço dos alimentos 12/02/08 entrevista com José Batista de Oliveira.


As empresas transnacionais controlam toda a produção das principais commodities e controlam o comércio mundial. Em cada ramo, temos, no máximo, dez empresas que controlam produção, processamento e comércio. Portanto, hoje o preço de cada mercadoria internacionalizada é objecto de especulação. Já não há uma relação directa do preço com o custo de produção, que é apenas uma referência. A manipulação maior dessas empresas sobre a produção nacional e o comércio internacional é um instrumento para alcançar os seus lucros. A influência desse sector sobre a política económica do governo Lula é por meio do Banco Central, que monitora as taxas de juros e câmbio.Que empresas controlam o comércio de commodities da alimentação?
O preço e o comércio de soja e das commodities agrícolas em geral são manipulados por conglomerados estrangeiros, como a americana Cargill, a holandesa Bunge, a americana-canadense ADM, a suíça Syngenta, a americana Monsanto, e a francesa Dryfuss. Na área de lacticínios, o mercado é manipulado por apenas três: a suíça Nestlé, a italiana Parmalat e a francesa Danone. Na área de venenos e remédios, também são poucas empresas, como a alemã Bayer, a suíça Syngenta, a alemã Basf e a suíça Norvartis.

São os próprios agricultores que produzem as sementes, mas por reproduzirem a soja transgénica da Monsanto, que nem produz tanta semente, têmm de pagar royalties todos os anos.
Até que ponto a produção convencional pode ser aumentada para fazer frente à procura crescente por alimentos no mundo?As grandes empresas não querem produzir alimentos, querem produzir lucro. Cerca de 50 empresas transnacionais controlam toda a produção agrícola no mundo. Aqui no Brasil, cerca de 50 empresas controlam quase todo o comércio agrícola nacional, sendo 30 transnacionais e 20 brasileiras. Por isso, elas não têm como objectivo alimentar o mundo, mas produzir commodities valorizadas no mercado internacional.
O Brasil lucra com o agronegócio?O agronegócio é a parceria entre o latifúndio, as empresas transnacionais da agricultura e o mercado financeiro, que subordina o uso das terras e os recursos naturais brasileiros às necessidades das grandes empresas e à especulação. Se a procura se mantiver alta, as empresas e investidores estrangeiros vão continuar a comprar fazendas no país, comprometendo a capacidade de produção das nossas terras, exaurindo os nossos recursos naturais com práticas técnicas que comprometem o futuro da natureza, com a imposição da monocultura, que destrói a biodiversidade e expulsa mão-de-obra do campo. Isso é um perigo para a nossa soberania nacional, pois os estrangeiros obedecem a interesses de fora e não têm qualquer compromisso com a preservação do meio ambiente, explorando-nos ao máximo para depois se irem embora com seus lucros.Qual o papel da agricultura familiar nesse contexto?
Os agricultores familiares passam por uma crise de falta de mercado e de contenção de preços. A população não tem rendimento para aumentar o consumo de queijo, pão, leite, iogurte, carnes e embutidos produzidos por essa faixa. A pequena agricultura não consegue avançar sem um projecto de desenvolvimento nacional que tenha como centro o fortalecimento do mercado interno, a distribuição de rendimento, a indústria nacional para sustentar a geração de emprego e o rendimento para o povo. Precisamos de um novo modelo agrícola baseado na pequena e na média propriedade, na prioridade à produção de alimentos para o mercado interno, na criação de uma nova matriz produtiva no campo, na adopção de técnicas de produção que respeitem o ambiente, sem agrotóxicos.Se realmente a procura está a crescer mais que a produção, os transgénicos passam a ser uma boa opção?Não. Os transgénicos não são simplesmente organismos geneticamente modificados, mas produtos criados em laboratórios que colocam a agricultura nas mãos do mundo financeiro e industrial. Não estamos mais diante da agricultura tradicional, mas de grupos que lançam mãos de transgénicos para controlar as sementes e impor o uso de insumos e venenos que produzem. Os transgénicos passam para as transnacionais o papel dos camponeses e povos originários de fazer o melhoramento das sementes e cultivos. Além disso, não existem estudos que comprovem que esses produtos não causam problemas à saúde.

A política de reforma agrária do governo Lula foi insignificante em comparação à ofensiva do capital na compra de terras e sobre o controle da produção agrícola no país. Os número divulgados neste ano confirmam a nossa avaliação de que a Reforma Agrária deixou de ser uma prioridade do governo Lula, que fez uma opção pela monocultura para exportação do agronegócio, que concentra terra e destrói o ambiente, beneficiando somente empresas estrangeiras e latifundiários. O governo está em dívida com os 150 mil trabalhadores rurais do movimento acampados em todo o país e precisa honrar os seus compromissos históricos com a Reforma Agrária e com o combate à pobreza no campo.Se por um lado os números mostram 2007 como o pior ano da gestão Lula, de outro, o Ministério da Agricultura afirma que 2007 foi o ano em que mais se investiu em qualidade da reforma agrária nos últimos 10 anos. O argumento tem sentido?O aumento dos investimentos do ministério é importante, mas a Reforma Agrária depende antes de tudo de vontade política e coragem para enfrentar o agronegócio e mudar a política económica, que beneficia por meio de empréstimos do Banco do Brasil e do BNDES as empresas transnacionais. O governo precisa criar coragem e cumprir a Constituição, que determina que áreas que desrespeitam a legislação trabalhista e ambiental, como fazem os produtores de cana, seja desapropriada e destinada para a Reforma Agrária.Esses recursos do Ministério da Agricultura foram aplicados num modelo de reforma agrária que agrada ao movimento? Se não, quais são as principais críticas ao modelo?
O problema não é a forma como o ministério está a investir os seus recursos, mas o papel que o governo reserva para o campo e para a agricultura. Em 2007, o governo federal pagou R$ 160,3 mil milhões em juros, quatro vezes mais do que tudo o que gastou no social e correspondente a 6,3% do PIB (Produto Interno Bruto), passando o dinheiro pago em impostos por toda a sociedade para o mercado financeiro e para os especuladores, que investem justamente nas empresas transnacionais da agricultura. O ministro Cassel ignora essa brutal transferência de renda para as empresas do agronegócio quando comemora o investimento realizado no ano passado.Qual deve ser a postura do MST frente à lentidão do governo na reforma agrária?
O MST e todos os movimentos da Via Campesina do Brasil vão continuar a fazer luta, com ocupações de terras e protestos para denunciar a destruição ambiental e a concentração de terra pelo avanço do agronegócio. Em 2007, fizemos grandes mobilizações. Vamos continuar o trabalho de consciencialização da população e alertar para esse perigo de desnacionalização da nossa agricultura. Infelizmente, nós não conseguimos avançar na resolução dos problemas concretos da classe trabalhadora. Esperamos que as mobilizações para o ano que vem aumentem e que essas mobilizações consciencializem o próprio governo Lula


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