estruturalismo e pós-estruturalismo 23/11/07 por Michael Peters.




Jakobson enfatiza que o Círculo Lingüístico de Praga está estreitamente ligado às correntes contemporâneas tanto da Lingüística ocidental quanto da lingüística russa: "as realizações metodológicas da lingüística francesa", a fenomenologia alemã (Husserl) e a pretendida síntese das escolas polonesa (de Courtenay) e russa (Fortunatov). É importante observar que Jakobson definiu sua teoria da estrutura da linguagem em contraste com a de Saussure, que ele considerava tanto demasiadamente abstrata quanto demasiadamente estática. Jakobson tratou as formulações dicotômicas (langue/parole, sincronia/diacronia) de Saussure de uma forma dialética, insistindo na estreita relação entre forma e significado, em uma situação de sincronia dinâmica (WAUGH & MONVILLE-BURSTON, 1990, p. 9).


Após a publicação de Anthropologie structucturale, a revolução estruturalista floresce na França, especialmente durante os anos 60: Roland Barthes, iniciado na lingüística por A. J. Greimas, no início dos anos 50, publica sua Mythologies em 1957 e torna-se Directeur d'études, em "sociologia dos signos, dos símbolos e das representações", da École des Hautes Études, em 1962; o jornal literário de vanguarda Tel Quel é fundado, em 1960, por Philippe Sollers; Michel Foucault publica Folie et deraison: histoire de la folie à l'âge classique, em 1961; em 1963, Louis Althusser convida Jacques Lacan para dar seu seminário na École Normale, iniciando um produtivo diálogo entre o marxismo e a psicanálise; o ano de 1966 vê a publicação do livro Pour Marx, de Louis Althusser, do Les mots et les choses, de Foucault, e dos Écrits, de Lacan (DOSSE, 1997).

Em uma primeira aproximação, podemos dizer que uma estrutura é um sistema de transformações. Na medida em que é um sistema e não uma simples coleção de elementos e de suas propriedades, essas transformações envolvem leis: a estrutura é preservada ou enriquecida pelo próprio jogo de suas leis de transformação que nunca levam a resultados externos ao sistema nem empregam elementos que lhe sejam externos. Em suma, o conceito de estrutura é composto de três idéias-chave: a idéia de totalidade, a idéia de transformação e a idéia de auto-regulação. (PIAGET, 1971, p. 5)
A idéia de totalidade surge da distinção entre estruturas e agregados. Apenas as estruturas podem ser consideradas como totalidades, enquanto os agregados são formados de elementos que são independentes dos complexos nos quais eles entram: "os elementos de uma estrutura estão subordinados a leis e é nos termos dessas leis que a estrutura qua totalidade ou sistema é definida" (p. 7). A natureza dos todos estruturais depende de suas leis de composição que, por sua vez, governam as transformações do sistema, sejam elas matemáticas (por exemplo, 1+1 "fazem" 2), sejam elas temporais. A idéia de auto-regulação implica tanto uma automanutenção quanto um fechamento e Piaget menciona três mecanismos básicos de auto-regulação: ritmo (como em biologia), regulação (no sentido cibernético) e operação (no sentido da lógica).
Piaget discute, então, os seguintes temas: as estruturas matemáticas; as estruturas físicas e biológicas; as estruturas psicológicas (a psicologia da Gestalt, a gênese da inteligência); o estruturalismo lingüístico (incluindo a gramática generativa de Chomsky); a análise estrutural nas ciências sociais (centrando-se na antropologia estrutural de Lévi-Strauss); e, finalmente, o estruturalismo e a filosofia. No capítulo 7, "Estruturalismo e filosofia", Piaget (1971, p. 120) discute as relações entre o estruturalismo e a dialética: "Na medida em que se opta pela estrutura e se desvaloriza a gênese, a história e a função ou até mesmo a atividade do próprio sujeito, não se pode deixar de entrar em conflito com os princípios centrais dos modos dialéticos de pensamento". Nesse contexto, Piaget entra, primeiramente, no debate entre Lévi-Strauss e Sartre, para concluir que não existe qualquer conflito inerente entre estruturalismo e dialética e, em segundo lugar, define o livro de Foucault, Les mots et les choses, como um "estruturalismo sem estruturas", buscando demonstrar que "não pode existir um estruturalismo coerente à parte do construtivismo" (p. 135). Ele sugere que, em vez de postular estruturas, Foucault fala de epistemes ligadas à linguagem e que, para Foucault, as ciências humanas não passam de resultados de mutações de epistemes que se seguem umas às outras no tempo, sem qualquer seqüência pré-ordenada ou necessária. Essa arqueologia das ciências humanas decreta o fim do homem. Em sua conclusão, Piaget discute especificamente essa pane mais radical do trabalho de Foucault. Ele argumenta que as "estruturas" não mataram o homem, nem aniquilaram as atividades do sujeito. [...] Em primeiro lugar, convém distinguir entre o sujeito individual [...] e o sujeito epistêmico [...]. Em segundo lugar, é preciso separar a tomada de consciência, sempre fragmentária e, com freqüência deformante, daquilo que o sujeito consegue fazer em suas atividades intelectuais: dessas últimas ele conhece apenas seus resultados, mas não seus mecanismos. (PIAGET, 1971, p. 139) Foucault, em uma rara entrevista, na qual discute diretamente a.questão do estruturalismo e do pós-estruturalismo, deixa claro que o estruturalismo não era uma invenção francesa e que o momento francês do estruturalismo durante os anos 60 deveria ser visto, de forma apropriada, contra o pano de fundo do formalismo europeu. Foucault sugere que, à parte aqueles que aplicaram métodos estruturais na lingüística e na mitologia comparativa, nenhum dos protagonistas do movimento estruturalista sabia muito bem o que estava fazendo. Embora Foucault (1983, p. 205) declare nunca ter sido um estruturalista, ele reconhece que o problema discutido pelo estruturalismo era um problema muito próximo de seus interesses tais como ele os definiu em várias ocasiões: "o problema do sujeito e de sua reformulação".Para Foucault, as investigações estruturalistas, muito diversas sob outros aspectos, convergiam em um único ponto: sua oposição filosófica à "afirmação teórica do primado do sujeito", que tinha sido dominante na França desde a época de Descartes e que tinha servido de postulado fundamental para uma ampla gama de abordagens filosóficas, dos anos 30 aos 50, incluindo o existencialismo fenomenológico, "uma espécie de marxismo às voltas como conceito de alienação" (FOUCAULT, 1991, p. 86), e as tendências no campo da psicologia que negam o inconsciente. Ele também se refere ao "problema do estruturalismo" na França como uma conseqüência de problemas mais importantes na Europa Oriental, uma história mais profunda, à qual a maior parte da comunidade acadêmica francesa estava cega (FOUCAULT, 1991, p. 88). E contudo, ele sugere, os comunistas e outros marxistas tinham tido a premonição de que o estruturalismo estava preste a dar um fim à cultura marxista tradicional na França: "uma cultura de esquerda que não fosse marxista estava prestes a surgir" (FOUCAULT, 1991, p. 90).A posição de Foucault relativamente ao marxismo era uma posição influenciada por questões bastante locais: ele estava reagindo ao Partido Comunista Francês, de inclinação stalinista, e ao domínio filosófico de um marxismo existencialista, durante os anos 40 e 50. Abstraindo-se essas questões locais, entretanto, pode-se afirmar que não existe nada de necessariamente antimarxista ou pós-marxista seja no pós-modernismo, seja no pós-estruturalismo. Na verdade, da mesma forma que Louis Althusser fez uma leitura estruturalista de Marx, é possível fazer uma leitura pós-estruturalista, desconstrutivista ou pós-modernista de Marx. Na verdade, o marxismo estruturalista althusseriano teve urna enorme influência sobre a geração de pensadores que nós agora chamamos de "pós-estruturalistas" e cada um deles, à sua própria maneira, acertou suas contas com Marx: vejam-se, por exemplo, as Observações sobre Marx (1991) que Foucault fez em entrevista com o marxista italiano Duccio Trombadori; ou os Espectros de Marx, de Derrida (1994); ou a tese da mercantilização "marxista" no livro de Lyotard, A condição pós-moderna. No período que antecedeu sua morte, Deleuze estava escrevendo um livro sobre Marx - ele se via, claramente, como um tipo de marxista (DELEUZE, 1995, p. 171). Todos esses pós-estruturalistas vêem a análise do capitalismo como um problema central: eles tentam compreender a forma pela qual o capitalismo se transforma para não ter que agir contra suas próprias limitações, "decodificando" a nova axiomática capitalista que governa um sistema financeiro global, claramente evidente nas "sociedades de controle" baseadas em uma economia simbólica (JAMESON, 1997).

O pós-estruturalismo pode ser caracterizado como um modo de pensamento, um estilo de filosofar e uma forma de escrita, embora o termo não deva ser utilizado para dar qualquer idéia de homogeneidade, singularidade ou unidade. O termo "pós-estruturalismo" é, ele próprio, questionável. Mark Poster (1989, p. 6) observa que o termo "pós-estruturalismo" tem sua origem nos Estados Unidos e que a expressão "teoria pós-estruturalista" nomeia uma prática tipicamente estadunidense, uma prática baseada na assimilação do trabalho de uma gama bastante diversificada de teóricos. De forma mais geral, podemos dizer que o termo é um rótulo utilizado na comunidade acadêmica de língua inglesa para descrever uma resposta distintivamente filosófica ao estruturalismo que caracterizava os trabalhos de Claude Lévi-Strauss(antropologia), Louis Althusser (marxismo), Jacques Lacan (psicanálise) e Roland Barthes (literatura).
Manfred Frank (1988), um filósofo alemão contemporâneo, prefere o termo"neoestruturalismo", enfatizando, assim, uma continuidade com o "estruturalismo", tal como o faz John Sturrock (1986, p. 137) que, centrando-se em Jacques Derrida, "o" pós-estruturalista (o crítico mais agudo e de maior peso que o estruturalismo teve) - interpreta o "pós" da expressão "pós-estruturalismo" como nomeando algo que "vem depois e que tenta ampliar o estruturalismo, colocando-o na direção certa". Segundo Sturrock, "o pós-estruturalismo é uma crítica ao estruturalismo, feita a partir ele seu interior: isto é, ele volta alguns dos argumentos do estruturalismo contra o próprio estruturalismo e aponta certas inconsistências fundamentais em seu método, consistências que os estruturalistas ignoraram". Richard Harland (1987), em contraste, cunha o termo "superestruturalismo" como uma espécie de expressão "guarda-chuva", tendo como base um quadro de pressupostos subjacentes, comuns a "estruturalistas, pós-estruturalistas, semióticos (europeus), marxistas althusserianos, lacanianos, foucaultianos et alii" (HARLAND, 1993, p. ix-x). Todas essas expressões ("pós-estruturalismo", "neoestruturalismo" e "superestruturalismo") mantêm como central a proximidade histórica, institucional e teórica ao movimento do "estruturalismo". Assim, o termo exibe uma certa ambigüidade: ele nomeia o novo, timidamente e sem grande confiança, simplesmente distinguindo-o do passado. Existem importantes afinidades entre formas de estruturalismo e pós-estruturalismo, bem como inovações teóricas distintas, como veremos mais adiante.
Entretanto, o pós-estruturalismo não pode ser simplesmente reduzido a um conjunto de pressupostos compartilhados, a um método, a uma teoria ou até mesmo a uma escola. E melhor referir-se a ele como um movimento de pensamento - uma complexa rede de pensamento – que corporifica diferentes formas de prática crítica. O pós-estruturalismo é, decididamente, interdisciplinar, apresentando-se por meio de muitas e diferentes correntes.Como uma atividade francesa e predominantemente parisiense, o pós-estruturalismo de primeira geração é inseparável do milieu intelectual imediato que predominou na França do pós-guerra, em uma história dominada por forças intelectuais variadas: o legado das interpretações "existencialistas" da Fenomenologia de Hegel, feitas por Alexander Kojéve e Jean Hyppolite; a fenomenologia do Ser de Heidegger e o existencialismo de Sartre; a redescoberta e a "leitura" estruturalista de Freud, feitas por Lacan; a onipresença de Georges Bataille e Maurice Blanchot; a epistemologia radical de Gaston Bachelard e os estudos da ciência de Georges Canguilhem. Provavelmente o mais importante é que o pós-estruturalismo inaugura e registra a recepção francesa de Nietzsche, o qual forneceu as fontes de inspiração para muitas de suas inovações teóricas. E também decisiva para a emergência do pós-estruturalismo, sem dúvida, a interpretação que Martin Heidegger (1991/1961) fez de Nietzsche, bem como as leituras de Nietzsche feitas por Deleuze, Derrida, Foucault, Klossowski e Koffman, desde o início dos anos 60 até os anos 70 e 80. O pós-estruturalismo é inseparável também da tradição estruturalista da lingüística baseada no trabalho de Ferdinand de Saussure e de Roman Jakobson, bem como das interpretações estruturalistas de Claude Lévi-Strauss, Roland Barthes, Louis Althusser e Michel Foucault (da primeira fase). O pós-estruturalismo, considerado em termos da história cultural contemporânea, pode ser compreendido como pertencendo ao amplo movimento do formalismo europeu, com vínculos históricos explícitos tanto com a lingüística e a poética formalista e futurista quanto com a avant-garde artística européia.Foi, sem dúvida, central para a emergência do pós-estruturalismo a redescoberta, por um grupo de pensadores franceses, da obra de Friedrich Nietzsche. Foram importantes também a interpretação que Martin Heidegger fez dessa obra, bem como as leituras estruturalistas tanto de Freud quanto de Marx. Considerava-se que, enquanto Marx havia privilegiado a questão do poder e Freud havia dado prioridade à idéia de desejo, Nietzsche era um filósofo que não havia privilegiado qualquer um desses conceitos em prejuízo do outro. Sua filosofia oferecia uma saída que combinava poder e desejo.A recepção estadunidense da desconstrução e a formulação do conceito de "pós-estruturalismo" no mundo de fala inglesa coincidem com o momento em que Derrida apresenta seu ensaio "A estrutura, o signo e o jogo no discurso das ciências humanas", no Colóquio Internacional sobre Linguagens Críticas e Ciências do Homem, na Universidade Johns Hopkins, em outubro de 1966. Richard Macksey e Eugenio Donato (1970, p. X) descreveram a conferência como "a primeira vez, nos Estados Unidos, em que o pensamento estruturalista foi considerado como um fenômeno interdisciplinar". Mesmo antes do término da conferência, havia claros indícios de que o reinante paradigma transdisciplinar do estruturalismo tinha sido superado, embora apenas um parágrafo das "Observações conclusivas" de Macksey assinalasse as "reavaliações radicais de nossos presssupostos [estruturalistas]" feitas por Derrida (p. 320).
No agora clássico ensaio "A estrutura, o signo e jogo no discurso das ciências humanas", Derrida (1978, p. 278-80) questionava a "estruturalidade da estrutura" ou a idéia de "centro" que, ele argumentava, operava para limitar o jogo da estrutura:[...] toda a história do conceito de estrutura [...] tem de ser pensada como uma série de substituições de centro para centro, um encadeamento de determinações do centro. O centro recebe, sucessiva e regularmente, formas ou nomes diferentes. A história da metafísica, como a história do Ocidente, seria a história dessas metáforas e dessas metonímias. A sua matriz seria [...] a determinação do ser como presença em todos os sentidos desta palavra. Poder-se-ia mostrar que todos os nomes do fundamento, do princípio, ou do centro, sempre designaram o invariante de uma presença (eidos, arche, telos, energeia, ousia [essência, existência, substância, sujeito], aletheia, transcendentalidade, consciência, Deus, homem, etc.). Derrida colocava em questão, nesse parágrafo, o estruturalismo francês da década anterior e, ao mesmo tempo, apontava a direção de suas próprias ambições intelectuais. O "descentramento" da estrutura do significado transcendental e do sujeito soberano pode ser encontrado, sugere Derrida, nomeando suas fontes de inspiração, na crítica nietzscheana da metafísica e, especialmente, na critica dos conceitos de ser e de verdade; na crítica freudiana da autopresença, "da consciência, do sujeito, da auto-identidade e da autoproximidade ou da autopossessão"; e, mais radicalmente, na destruição heideggeriana da metafísica, "da determinação do Ser como presença". Derrida discute, ao longo desse ensaio, o tema do "descentramento", concluindo por distinguir duas interpretações de estrutura. Uma delas, de origem hegeliana e exemplificada no trabalho de Lévi-Strauss, sonha "decifrar uma verdade e uma origem que escapem ao jogo e à ordem do signo", buscando aí a "inspiração de um novo humanismo". A outra, "que já não está voltada para a origem, afirma o jogo e procura superar o homem e o humanismo..." (DERRIDA, 1978, P.292)O humanismo tendia, como um motivo central do pensamento liberal europeu, a colocar o "sujeito" no centro da análise e da teoria, vendo-o como a origem e a fonte do pensamento e da ação, enquanto o estruturalismo, ao menos em uma leitura althusseriana, via os sujeitos como simples portadores de estruturas. Os pós-estruturalistas continuam, de formas variadas, a sustentar essa compreensão estruturalista do sujeito, concebendo-o, em termos relacionais, como um elemento governado por estruturas e sistemas, continuando a questionar também as diversas construções filosóficas do sujeito: o sujeito cartesiano-kantiano, o sujeito hegeliano e fenomenológico; o sujeito do existencialismo, o sujeito coletivo marxista.A genealogia do pós-estruturalismo francês tem que ser compreendida, em parte, por suas filiações com o pensamento de Nietzsche. Em particular; com sua crítica da verdade e sua ênfase na pluralidade da interpretação; com a centralidade que ele concede à questão do estilo, visto como crucial, tanto filosófica quanto esteticamente, para que cada um se supere a si próprio, em um processo de perpétuo autodevir; com a importância dada ao conceito de vontade de potência e suas manifestações como vontade de verdade e vontade de saber. Esses temas filosóficos foram assumidos, adotados e experimentados pelos pós-estruturalistas franceses sob novas e estimulantes formas. Foucault, por exemplo, desenvolveu a genealogia nietzscheana como uma forma de história crítica que resiste à busca por origens e essências, concentrando-se, em vez disso, nos conceitos de proveniência e emergência. Ao analisar; por meio do uso de narrativas e da narratologia, a pragmática da linguagem, Lyotard demonstra a mesma aversão que tinha Nietzsche pelas tendências universalizantes da filosofia moderna. Derrida, seguindo Nietzsche, Heidegger, e Saussure, questiona os pressupostos que governam o pensamento binário, demonstrando como as oposições binárias sustentam, sempre, uma hierarquia ou urna economia que opera pela subordinação de um dos termos da oposição binária ao outro, utilizando a desconstrução para denunciar, deslindar e reverter essas hierarquias. Deleuze (1983, original de 1962) fixa-se na diferença como o elemento característico que permite substituir Hegel por Nietzsche, privilegiando os "jogos da vontade de potência" contra o "trabalho da dialética".Todos esses pensadores enfatizam que o significado é uma construção ativa, radicalmente dependente da pragmática do contexto, questionando, portanto, a suposta universalidade das chamadas "asserções de verdade". Foucault vê a verdade como o produto de regimes ou gêneros discursivos que têm seu próprio e irredutível conjunto de regras para construir sentenças ou proposições bem formadas. Seguindo Nietzsche, todos eles questionam o sujeito cartesiano-katiano humanista, ou seja, o sujeito autônomo, livre e transparentemente autoconsciente, que é tradicionalmente visto como a fonte de todo o conhecimento e da ação moral e política. Em contraste, e seguindo a crítica da filosofia liberal feita por Nietzsche, eles descrevem o sujeito em toda sua complexidade histórica e cultural - um sujeito "descentrado" e dependente do sistema lingüístico, um sujeito discursivamente constituído e posicionado na intersecção entre as forças libidinais e as práticas socioculturais. O sujeito, outra vez sob a influência de Nietzsche, é visto, em termos concretos, como corporificado e generificado, ser temporal, que chega, fisiologicamente falando, à vida e enfrenta a morre e a extinção como corpo, mas que é, entretanto, infinitamente maleável e flexível, estando submetido às praticas e às estratégias de normalização e individualização que caracterizam as instituições modernas.
Devemos compreender o pós-estruturalismo, no seu desenvolvimento no contexto histórico francês, tanto como uma reação quanto como uma fuga, relativamente ao pensamento hegeliano. Essa reação ou fuga, para sintetizar a questão em termos deleuzianos, envolve, essencialmente, a celebração do "jogo da diferença" contra o "trabalho da dialética". O livro de Deleuze, Nietzsche e a filosofia, representa um dos momentos inaugurais do pós-estruturalismo francês, em uma interpretação de Nietzsche que enfatiza o jogo da diferença, utilizando esse último conceito como o elemento central de um vigoroso ataque à dialética hegeliana. Tal como sintetizado pelo próprio Deleuze:Três idéias definem a dialética: a idéia de um poder do negativo como principio teórico que se manifesta na oposição e na contradição; a idéia de um valor do sofrimento e da tristeza, a valorização das "paixões tristes", como princípio prático que se manifesta na cisão, na separação; a idéia da positividade como principio teórico e prático da própria negação. Não é exagero dizer que toda a filosofia de Nietzsche, em seu sentido polêmico, é a denúncia dessas três idéias (1983, p. 195-96). Deleuze contrasta a força negativa da dialética e sua predisposição puramente reativa - o positivo é obtido apenas por meio da dupla negação, "a negação da negação" - com a força puramente positiva da afirmação inerente à "diferença", a qual é tomada como a base de um pensamento radical que não é nem hegeliano nem marxista. Em uma vigorosa passagem, Deleuze afirma: "A dialética hegeliana consiste, na verdade, em uma reflexão sobre a diferença, mas de imagem invertida. No lugar da afirmação da diferença como tal, ela coloca a negação daquilo em relação ao qual ela difere; no lugar da afirmação do eu, ela coloca a negação do outro; e no lugar da afirmação da afirmação, ela coloca a famosa negação da negação" (1983, p. 196). Em suma, a dialética hegeliana reflete uma falsa imagem da diferença. A crítica nietzscheana da dialética, feita por Deleuze, uma das chaves para se compreender o pós-estruturalismo francês, deveria ser mais reconhecida como uma base legítima para uma teorização radical alternativa. A interpretação que Deleuze faz de Nietzsche torna-se, de fato, o ponto de virada para a filosofia francesa, abrindo novos espaços para o filosofar; ajudando a re-instaurar uma tradição banida e fornecendo as bases para um modo alternativo de pensamento crítico tanto dentro da França quanto fora dela.Em sua primeira geração, o pós-estruturalismo é exemplificado pelo trabalho de Jacques Derrida, Michel Foucault, Julia Kristeva, Jean-François Lyotard, Gilles Deleuze, Luce Irigaray; Jean Baudrillard, entre muitos outros. Historicamente, sua formação e seu desenvolvimento institucional inicial podem ser ligados à influente revista Tel Quel, havendo fortes conexões com figuras literárias tais como Maurice Blanchot e Roland Barthes. Os pensadores pós-estruturalistas desenvolveram formas peculiares e originais de análise (gramatologia, desconstrução, arqueologia, genealogia, semioanálise), com freqüência dirigidas para a crítica de instituições específicas (como a família, o Estado, a prisão, a clínica, a escola, a fábrica, as forças armadas, a universidade e até mesmo a própria filosofia) e para a teorização de uma ampla gama de diferentes meios (a "leitura", a "escrita", o ensino, a televisão, as artes visuais, as artes plásticas, o cinema, a comunicação eletrônica).


4 Comments:
At 1/09/2008,
Anonymous said…
Tá fudido com esse papo de estruturalismo. Veja em "Marxismo e filosofia da lionguagem" as críticas de Mikahil Bakhtin, seu merda. Essa porra de papo estrutural não passa de objetivismo abstrato, vacilão. Vá ler mais , cagalhão metido a inelectual......
At 4/29/2008,
Anonymous said…
Nossa! que comentário fazio, percebe-se que aquele que o fez não tem noção da importância de cada momento/fase dos estudos, sejam eles lingüísticos ou literários. Não é porque outras idéias foram desenvolvidas através de críticas ao estruturalismo que esta fase deve ser desmerecida. Este trabalho está ótimo, o conteúdo, a seqüência cronológica, os fatos abordados. Parabéns.
At 8/01/2008,
Anonymous said…
Prabéns pelo trabalho, ele veio a me exclarecer vários pontos sobre o estruturarismo e pós-estruturalismo. Valeu!
At 1/04/2009,
Anonymous said…
Parabéns pelo belíssimo trabalho! Pobre comentarista, o primeiro, que quis se passar por crítico e intelectual, nem identificou-se, tolo.
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